Tuesday, June 29, 2010

Dos cães

Gosto muito dos animais caninos, a sério que gosto.
Billy era como se chamava o nome do meu primeiro e único cão. Atenção não quero fazer qualquer elogio de tenacidade a Manuel Alegre pelo livro "Cão como nós", mas reconheço que falar sobre eles é como descrever um amor de Verão. Ou seja, aquele amor que não é demasiadamente forte para nos deixar depressivos quando desaparece, mas que é suficiente para causar um pequeno abalo ao coração. Fiz o meu luto durante alguns dias.
Lembro-me como se fosse hoje daquela manhã em que encontrámos o Billy no chão, sem a alegria que se percebia que tinha quando via os donos, sem dar pulos e corridas majestosas. O Billy tinha sido atacado por outros animais da sua espécie. Indefeso, como estava não conseguiu resistir. Os animais são territorias quando menos se espera estão a lutar pelo seu território, aliás, como o ser humano, nas suas relações amiúdes vezes surgem em confrontos directos. A tirania de alguns países e as nossas relações emocionais são também sinónimo disso. Somos egoístas e queremos marcar o que conquistamos, se possível com um estandarte.
Voltemos ao Billy - nome inspirado num grupo musical dos anos noventa. Na altura o meu irmão mais velho quis que o nosso primeiro cão tivesse o mesmo nome que o seu ídolo de adolescente: vocalista dos Green Day. Hoje ao falarmos sobre isso dá-nos cólicas de rir.
Desde então nunca mais pensei em ter um, e por isso o meu modo de andar na rua também mudou.
Em suma, tenho reparado que por onde quer que passe, seja em corrida ou num simples passeio, há dejectos no chão a perturbarem o caminho e isso irrita-me tanto mas tanto que não vos passa pela cabeça: todas as manhãs quando vou para o trabalho tenho de ver onde ponho os pés para não acertar na merda dos outros Arghn!

Thursday, June 24, 2010

Portajar

SCUT. Esta sigla significa: Sem Custo para os UTilizadores. Reitero, sem custo.
De acordo com a Wikipédia, que dá sempre muito jeito ainda que não seja um instrumento instrutivo cem por cento fidedigno,a sigla foi introduzida decorria o ano de 1997,pelo chefe de governo António Guterres. Então e agora, vamos mudar de nome se se vier a portajá-las? Tenham dó(!), nem todos vivem acima dos oitocentos euros por mês ilíquidos. Somos o nono país mais pobre da União Europeia e apenas temos mais poder de compra que a Hungria, a Estónia, a Polónia, a Lituânia, a Letónia, a Roménia e a Bulgária, países considerados novatos em matéria de Europa. Parece que desde 1986 até à data nada mudou: continuamos pobres e sem produção de riqueza. Os dados são reveladores, citando o Diário Económico há dois milhões de pobres em Portugal.

Friday, June 18, 2010

Com a alteração de feriados

não podia concordar mais.Transpor os feriados para as sextas-feiras a fim de evitar as chamadas "pontes"? Vamos a isso. Nem tudo é mau porque aqueles feriados que são ao fim-de-semana vão ser transpostos para segunda-feira. O que querem mais?

Tuesday, June 15, 2010

Mundial

E pronto, começou a febre e a distracção de milhões de portugueses. Será um orgulho ser português por causa do futebol? Para mim, o mundo do futebol é injusto, não faz qualquer sentido essas pessoas ganharem rios de dinheiro pelo que fazem, é simplesmente absurdo.

Saturday, June 12, 2010

"Vamos sentir falta de tudo aquilo de que não precisamos" a performance abriu o festival Alkantara no Porto e desceu até Lisboa


No penúltimo dia da terceira edição do festival de dança e teatro Alkantara, a Culturgest instalou a sua melhor blackbox para receber o espectáculo de dança/performance “Vamos sentir falta de tudo aquilo de que não precisamos”, o mais recente da coreógrafa Vera Mantera, desta feita acompanhada com convidados que interpretaram e co-criaram.
Ter estado lá é uma experiência transcendental. Não é dança, garantidamente. São movimentos de corpo e de mente. Tudo gira em torno de umas cabeças plásticas, imaginem aqueles manequins de montra, é do género. Ao longo de uma hora e quinze minutos entraram e saíram do palco quatro bailarinos principais – dois homens e duas mulheres – com personalidades muito distintas mas fortes. Traziam essas cabeças na mão como se fossem meros recipientes destinados aos mais variados fins. De dentro delas saíram, imagine-se: carros em miniatura, aviões também em formato mini, dinheiro em moedas e notas, dezenas de cartões de crédito, palha, uma mulher insuflável, diamantes e algumas outras coisas simbolicamente supérfluas, ou seja, uma verdadeira crítica à futilidade das ruas.
Por momentos é como se estivéssemos numa viagem ao mundo absurdo de David Lynch, mas em performance.
O espaço onde a acção acontece fica cheio de objectos. Quando pensávamos que já nada nos poderia surpreender entra uma das personagens com uma daquelas cabeças de manequins de montra numa mão e de lá de dentro começa a retira um líquido – não muito líquido - de cor cobre. De seguida começa a espalhá-lo pela cara plástica que tem na mão, como se fosse base de maquilhagem e vai chorando num momento que não fica muito claro. Como se a absurdez alguma vez fosse clara. Kafka também nunca foi concreto, Boris Vian também não. Há simplesmente mensagens que não têm sentido, são vazias, mas que têm significado por isso mesmo. Mas prosseguindo, “Vamos sentir falta de tudo aquilo de que não precisamos” é um jogo tenaz, quem se manteve até ao final pôde perceber que regras foram utilizadas - uma visão trágica da sociedade consumista. A terminar uma das duas bailarinas faz um brilharete, despertando o riso geral de quem assistia. De dentro de uma das cabeças tira um manual de instruções, como se de um electrodoméstico se tratasse, como se a nossa mente, para funcionar bem, tenha de ser utilizada com um livro de instruções. Ver para além do óbvio, do estático, pensar, é o que se pode retirar daí. O culminar dá-se quando estão todos os intervenientes em palco, uma espécie de elogio da loucura, com uns avião telecomandados a sobrevoar o espaço.
Uma performance que pode interpretar-se de várias formas e por isso a opinião não foi consensual: “foi interessante” disse, num tom bastante lato, um espectador.
Em síntese, é um espectáculo para uma minoria por isso se não gosta de escrita sarcástica e “fora” fez bem não ir. Se fosse retiraria talvez uma mensagem do género: use a sua mente segundo um bom manual de instruções, seja ético e boa pessoa, distinguindo claramente aquilo que faz falta do que não faz, caso contrário poderá avariar ou simplesmente bloquear o seu cérebro - limitar-se ao óbvio. Vera Mantero começou por ser uma bailarina da Gulbenkian, agora é e sempre será uma coreografa visionária.

Monday, June 7, 2010

O anjo negro de Luanda

“Uma mulher cai do céu durante uma tempestade tropical”. É esta a primeira frase da contracapa de “Barroco Tropical” - a décima oitava obra editada em português do escritor José Eduardo Agualusa. Ainda que nesta contagem se incluam textos soltos, crónicas e livros acaba por ser um número assustador, não no sentido semântico da palavra claro está, mas pela responsabilidade imputada numa fase de (quase) maturidade de Agualusa.
O título não podia ser mais eficaz e justo. Afinal o Barroco – estilo artístico que nasceu no século XVI em Itália – privilegia “os contrastes, a dramaticidade, a exuberância e realismo, e uma tendência ao decorativo, além de manifestar uma tensão entre o gosto pela materialidade opulenta e as demandas de uma vida espiritual”. Que definição tão perfeita para Kianda: artista, cantora e uma das personagens principais do livro. Ela busca incessantemente um conforto espiritual e afectivo, embora sem a coragem necessária no amor. Auto-consciente do seu dom vocal e representativo (aqui como no estilo barroco) que nasceu com ela. Considera-se uma estrela mas não consegue brilhar fora do palco sem alguém ao seu lado. Talvez o medo a ameace.
Do início ao fim da narrativa Lulu Pombeiro (o marido) foi para Kianda (a estrela) o rochedo no qual assenta toda a sua minha vida.
O encontro de Kianda e Bartolomeu Falcato (escritor e amante) é, no espaço e no tempo, fantástico. Ambiente noctívago com fumo à mistura, ou não estivessem num bar de jazz no bairro da Mouraria, em Lisboa. A conversa desembrenha-se no final da performance de Kianda e a superioridade da música africana face à brasileira é um dos temas do diálogo.
Os dois voltavam a encontrar-se anos mais tarde, no Rio de Janeiro. Atente-se à mensagem que despoleta aí o relacionamento proibido de ambos: “decifra-me ou devoro-te”.
“Barroco Tropical” centra-se, nas palavras de Agualusa, “ em como o medo destrói, transforma, transtorna, corrompe as pessoas. Como destrói as ligações de amizade, as relações familiares. Como as ditaduras e os regimes totalitários utilizam o medo, não só para submeter as pessoas mas para as degradar.” Ou seja, o sentimento do medo surge como um o fio condutor e transversal ao enredo.
Da dezena de personagens, para além dos amantes já apresentados, faz parte uma modelo – Núbia - que sofre calada; a beleza fez com que entrasse nos meandros delinquentes do poderio Angolano. A propósito ao longo dos vinte e cinco capítulos do livro, Agualusa vai destacando amiúdes vezes, no final de cada texto, parágrafos conclusivos com a realidade factual, e há intencionalidade nisto. Consciencializar para os problemas -- político-económico-socia l -- da antiga colónia portuguesa, como neste excerto: “o Povo, ou Eles, é como em Angola nós, os ricos, ou os quase ricos, designamos os que nada têm. Os que nada têm são a esmagadora maioria dos habitantes deste país”.
Os contos mirabolantes como o da caveira falante prometem divertir os cépticos e os supersticiosos. Mais, reza o mito que existe um tal anjo negro em Luanda, mantido e cuidado há séculos por um grupo de pessoas.
Relativamente ao tropical deste barroco é notório pela musicalidade da escrita e pelas cores inebriantes de uma Luanda de 2020. Estamos pois no domínio da literatura, das estórias dentro da própria história, fazendo-nos pensar no segundo sentido da vida. Agualusa está no seu melhor, ao estilo do vencedor “ O Vendedor de Pássaros” (2004). É a cultura lusófona senhores!